Chuva, lama, frio congelante, barulho de explosões e corpos por toda a parte. Era essa a triste realidade vivida pelos soldados dos Impérios Alemão e Britânico durante a 1ª Guerra Mundial, conflito que durou de 1914 a 1918. Em meio a todas essas cenas de horror, após cinco meses de inferno, o natal e o futebol viriam a trazer um pouco de alegria e paz aos combatentes. Foi a chamada “Trégua de Natal”, uma das histórias mais fantásticas do conflito mundial que custou 9 milhões de vidas e alimentou a Segunda Guerra.
Era véspera de Natal de 1914, poucos meses após o início da Guerra. Na Bélgica, em lados opostos, alemães e britânicos partilhavam de uma mesma esperança: a de que aquele confronto duraria pouco tempo. Acuados pelo frio rigoroso europeu e dispostos em posições defensivas, as tropas se aproximavam cada vez mais. De uma trincheira a outra, a distância chegava a ser de 100 metros. Unidos pelas condições desumanas da Guerra, os inimigos começavam a ceder para esquecer o sofrimento, nem que fosse por um instante.
A primeira tentativa de impor uma trégua no conflito veio do Papa Bento XV. Os governos envolvidos na Guerra, porém, não deram ouvidos a Sua Santidade. Foi então que os combatentes seguiram o coração, e não a hierarquia das autoridades. Em 24 de dezembro de 1914, eles impuseram de forma espontânea uma trégua de natal.

Foram 6 dias de cessar-fogo e união, com direito a várias celebrações, como troca de presentes entre os inimigos, comida compartilhada, cânticos natalinos e homenagens aos mortos de ambos os lados do confronto. O ponto alto do encontro entre os inimigos foi uma batalha, uma disputa amistosa no esporte mais popular do planeta.
Na cidade belga de Saint-Yvon, em um jogo disputado em “terra de ninguém”, só se ouviram os barulhos de chutes a gol e a queda dos atletas na comemorações de gols. A partida acabou com vitória de 3×2 para os alemães. O jogo só terminou porque a bola foi parar em um arame farpado, segundo conta o historiador Eric Hobsbawn no livro “A Era dos Extremos”.

Mesmo mais de um século depois, a partida jamais foi esquecida. O jogo épico é tema da música “Pipes of Peace” (flautas da paz, em tradução livre), do eterno Beatles, Paul McCartney. Em 2014, como motivo do centenário da “Trégua de Paz”, a UEFA organizou uma homenagem com a participação de diversas personalidades da política e do futebol. Nas proximidades de onde foi disputado o jogo, uma escultura foi erguida em memória aos combatentes.

Daquele dia, fica a mensagem extraída do relato de um soldado alemão à família: “Que maravilhoso e que estranho ao mesmo tempo. Afinal de contas, debaixo do uniforme, éramos todos iguais”. Símbolo do futebol como instrumento de união e paz.