Sindelar, o craque da Áustria que desafiou o Nazismo

Matthias Sindelar é uma lenda do futebol austríaco. Alto e magro, ele se destacava pela velocidade e habilidade. Por conta dessas virtudes, ganhou o apelido de “Homem de Papel. O jogador foi protagonista de grandes feitos da seleção semifinalista da Copa de 34 e campeã da Copa Intercontinental da Europa Central de 1936, uma espécie de Eurocopa. Craque dentro do campo, mostrou uma incomum coragem fora dele. E a razão disso tem nome e sobrenome: Adolf Hitler.

O Führer alemão – assim como a maioria dos ditadores – sabia do poder de mobilização do esporte e, por isso, queria a todo custo fazer da Alemanha uma potência em todas as modalidades. Conseguiu isso nos Jogos Olímpicos de 36, com o país sendo líder do quadro de medalhas, mas falhou no futebol. Na competição daquele ano, assistiu sua seleção ser eliminada pela improvável e fraca Noruega. De quebra, ainda viu a Itália comandada pelo Fascismo de Benito Mussolini se sagrar campeã, justamente contra a Áustria de Sindelar. Era, então, preciso fazer mais, caso a Alemanha quisesse bater de frente na Copa de 38 com os italianos, atuais campeões.

Em 12 de março de 1938, apenas três meses antes do início do Mundial, as tropas nazistas invadiram a Áustria, anexando o país à Alemanha. Assim, os jogadores daquela talentosa seleção austríaca, batizada de Wunderteam (“Time Maravilha”), deveriam disputar a Copa com a camisa germânica. De origem judia, Sindelar se recusou a jogar ostentando uma suástica em seu peito. Oficialmente, alegou não ter condições físicas e estar muito velho para disputar a Copa. Na época, ele tinha 38 anos.

Mesmo veterano, porém, Sindelar não se conteve em desafiar os alemães mais uma vez. Antes da incorporação dos jogadores austríacos à Alemanha, quis Hitler fazer um amistoso de despedida entre as duas seleções. Sabido das limitações futebolísticas dos germânicos, houve a recomendação interna de que a Áustria “aliviasse” para os representantes do Terceiro Reich. Não foi o que se viu naquele dia. Hitler não esteve no jogo, mas vários de seus oficiais foram obrigados a presenciar a fácil vitória de 2×0 da Áustria. Sindelar marcou o primeiro gol e comemorou com entusiasmo na frente da tribuna nazista, segundo conta o livro “150 anos de futebol”.

Mesmo diante de tamanha rebeldia, os alemães mantiveram o convite para que Sindelar jogasse a Copa. Partiu de Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda do III Reich, a garantia de que tudo seria esquecido se ele colocasse seu talento a serviço da Alemanha. O craque, porém, manteve sua posição inicial e, desde então, passou a ser perseguido pelos nazistas. Sua simpatia pela social-democracia passou a ser investigada pela Gestapo e Sindelar foi proibido de voltar a jogar futebol profissionalmente.

Em 22 de janeiro de 1939, cerca de um ano após o amistoso, Sindelar e sua companheira, a italiana Camila Castagnola, foram encontrados mortos no apartamento em que viviam, em Viena. A versão oficial apontou a causa da morte como asfixia por monóxido de carbono. Não faltou, porém, quem suspeitasse do envolvimento nazista na morte do jogador.

Estima-se que cerca de 20 mil pessoas tenham acompanhado o funeral do jogador no Cemitério de Viena. Em 1998, ele foi eleito o maior jogador de futebol da história da Áustria.

Túmulo de Sindelar no Cemitério de Viena

Ídolo austríaco, Sindelar se tornou uma lenda pelo que fez em campo e fora dele. Um craque que usou o futebol para desafiar o Nazismo.