Vágner de Araújo Antunes foi o típico boa praça carioca. Nascido e criado em Madureira, encarava as dificuldades da vida com um sorriso no rosto, um vistoso bigode e um pagode na vitrola. O apelido surgiu por chamar a todos de bacharel.
No final dos anos 1970, começou em sua Madureira os primeiros passos para ser jogador de futebol. Era um zagueiro raçudo, mas também elegante e com uma habilidade acima da média para a posição. Poderia até ser meia.
Após defender as cores do tricolor suburbano, Vágner Bacharel passou por Joinville, Internacional e Cruzeiro até chegar em 1983 ao Palmeiras (sua passagem mais marcante no futebol). Chegou com desconfiança da torcida, mas aos poucos conquistou sua titularidade e foi até cogitado para a seleção brasileira.
PALMEIRAS: SÓ FALTOU O TÍTULO
Bacharel foi um dos poucos destaques do alviverde nos anos 1980, mais conhecida como a “década perdida” para o Palmeiras e para a economia brasileira. Um período maldito na história do clube em que eram montados times limitados e como consequência sofria amargos fracassos.
A grande chance de Vágner ser campeão pelo Palmeiras surgiu no Campeonato Paulista de 1986. Após eliminar o Corinthians na semifinal, bastava ao clube vencer na final a Internacional de Limeira em dois jogos no Morumbi. Com bons nomes como Éder Aleixo, Mirandinha, Jorginho e Gérson Caçapa, a fatura parecia liquidada. Mas para incredulidade da torcida palmeirense, a Inter conquistou o título e impediu o fim do tabu verde (que àquela altura completava 10 anos). Porca Miséria!
Em 1987, era hora de procurar novos ares. O atleta vai para o Botafogo e depois desfila seu bigode por Sport, Guarani (perde o título paulista de 1988 para o Corinthians com um gol sofrido na prorrogação), Fluminense, Vila Nova, até chegar em dezembro de 1989 ao recém-nascido (ou recém-fundido) Paraná Clube.
PARANÁ: O ÚLTIMO DESAFIO
O Paraná Clube foi fundado em 19 de dezembro de 1989 e era uma fusão entre os clubes Colorado Esporte Clube e Esporte Clube Pinheiros, ambos de Curitiba e com história no futebol paranaense (o Colorado foi campeão estadual em 1980 e o Pinheiros em 1984 e 1987). Uma ousada iniciativa de união: o vermelho do Colorado (com grande torcida, mas desorganizado administrativamente) e o azul do Pinheiros (com grande patrimônio, mas com poucos torcedores). A junção de forças para maiores ambições no futebol brasileiro.
Com 35 anos, Bacharel já estava nas páginas finais de sua carreira no futebol e aceitou o desafio de jogar no primeiro elenco do Paraná Clube. Acaba capitão da equipe e mostra toda a sua liderança em campos paranaenses até o fatídico sábado de 14 de abril de 1990.
A TRAGÉDIA
Durante a partida contra o Campo Mourão, Vágner chocou-se de cabeça com o jogador adversário Charuto. Um lance forte, porém tão comum quanto aos que ocorrem atualmente em uma partida de futebol. Após ficar desmaiado por alguns minutos, o atleta foi encaminhado para o Hospital Evangélico onde ficou internado por dois dias em observação. Na unidade, ele recebe o diagnóstico de uma lesão leve e a receita de tomar analgésicos para dor de cabeça e Plasil, remédio contra vômitos.
Nenhum médico desconfiou que um choque de cabeça poderia causar uma lesão neurológica. Foi realizada uma radiografia na coluna, mas não uma tomografia do crânio. O atleta chegou até a dar entrevista no leito do hospital e fazer sinal de positivo. Parecia ter sido só um susto e em breve já estaria de volta aos campos.
Ao retornar para casa, Bacharel sente forte dores, sofre uma convulsão e retorna ao hospital horas depois. Ao finalmente fazer uma tomografia foi constatado um traumatismo craniano e um caso muito mais grave do que fora diagnosticado anteriormente. Após entrar em coma profundo, acaba falecendo em 20 de abril de 1990, seis dias após o fatídico lance.
Após a sua morte, a revista Veja publicou matéria de capa sobre o caso e o número elevado de erros médicos no Brasil. O país que há pouco mais de um mês recebera a notícia do confisco das poupanças, parecia em uma fase negra, em que boas notícias não apareceriam nunca mais nas capas de jornais ou revistas. Uma nação em crise econômica, social e de felicidade.
O atleta sobreviveria se o traumatismo fosse diagnosticado logo que foi internado? Difícil afirmar… infelizmente partiu um dos bigodes mais simpáticos do futebol brasileiro. Madureira chorou.